segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

História e identidade: o ritmo que Pilão Arcado samba

Redovagno Ribeiro

Pilão Arcado não é mais um bebê. Desde 1810 seu território ainda pouco explorado contrasta com uma vasta identidade histórica que preenche a sua vida já bem adulta. De uma forma, eu diria, rítmica. Rítmica porque ao longo dos seus 214 anos dança conforme a sua identidade esquece-se de bater forte em seus tambores.   

Bem antes de ser rebatizado era Vila da Nossa Senhora do Remanso de Pilão Arcado. Como se tudo virasse um filme em seu segundo lançamento, uma ação pública do Estado inaugurou seu primeiro teatro, logo, a sua história se repete para o nominar de Teatro Vila de Pilão Arcado.   

A astronomia popular desempenhou e ainda desempenha um papel central em práticas que vão do plantio à celebração de festas religiosas, construindo um vínculo entre a cidade e seu povo. O município tem um vasto calendário que anima sua população e marca a sua identidade. 

No Brejo da Serra, foi encontrada uma imagem de uma Santa deitada embaixo de um Juazeiro. Ela recebeu o nome de Nossa Senhora de Conceição de Aparecida de Pilão Arcado. A Santa seria a única sobrevivente do incêndio que destruiu a antiga Igreja da região. Todos os anos acontecem a peregrinação que vai de 1º a 15 de agosto. 

Campo Grande foi “polo” religioso e estudantil. Claro que tudo era simples. A faculdade de Dona Constância era feita de taipa. Constância era uma mulher de origem indígena que conviveu em Campo Grande, próximo da Sede de Pilão Arcado. Constância tinha lá as suas formas e modos de viver, o mais forte era ser teimosa e valentuada. A sua ideia e planos tinham que  prevalecer sobre qualquer outro. Constância não tinha boa relação com as pessoas comuns da região. Só depois de muitos anos seu relacionamento melhorou e ela passou a entender a vizinhança.

A casa foi construída com estrutura de taipa para abrigar as pessoas que vinham trabalhar na derruba de roças e na abertura de tanques. Com a chegada de mais pessoas foram aos poucos ampliando a casa onde chegou a residir muitas famílias. Ali tinha também o núcleo estudantil. A essa casa, deram o nome de Casa Grande

Embora a astronomia popular seja vista muitas vezes como algo folclórico, ela guarda recursos valiosos com a ciência moderna. Estudos mostram que os sertanejos de Pilão Arcado fornecem identificação de padrões climáticos ao observar o céu, como a intensidade das chuvas previstas pela nebulosidade ou brilho das estrelas. A flor do mandacaru por exemplo avisa que as chuvas estão próximas. Esse conhecimento tradicional tem potencial para dialogar com iniciativas de meteorologia e agricultura sustentável, contribuindo para soluções adaptadas à realidade do semiárido.

O Projeto Infra Brejos por mim escrito a pedido da Prefeitura Municipal é uma iniciativa abrangente para melhorar a infraestrutura e o desenvolvimento sustentável das comunidades localizadas nos Brejos de Dois Irmãos, Brejo da Serra e Brejos do Zacarias, todos eles ladeados por várias comunidades que juntas formam uma região ecologicamente rica e diversa.

As nascentes que jorram e as dunas do Brejo do Zacarias são partes mais emblemáticas desse sistema turístico, religioso e rico em minerais como o sal e uma imensa quantidade de frutas.

A região compunha um dos Distritos do Município de Pilão Arcado, e vivem exclusivamente da agricultura em regime de subsistência. Cada Brejo tem as suas peculiaridades e riquezas. 

Brejo Dois Irmão, é um tipo de entroncamento viário entre Pilão Arcado e a cidade de Barra, Bahia. Se destaca pela fabricação industrializada de doces, licores, rapaduras, cachaça e frutas nativas. Possui uma alta produção do buriti que é industrializado em fábrica da comunidade, através de órgãos estaduais baianos 

Brejo da Serra se destaca pela fabricação da melhor rapadura da região e um alto número de frutas nativas como a manga, o caju, buriti, mangaba, o coco entre outras.

Brejo do Zacarias é macro na produção de cachaça artesanal, frutas, doces, e possui uma área turística que desperta a curiosidade de visitantes e até de outras cidades e países no mundo inteiro. É um lugar rico em nascentes, espécies nativas como animais silvestres, plantas, frutas, comunidades tradicionais, blocos de trabalhadores e associações que se autoproclamam comunidades mais ricas em produtos naturais do município.

O coronelismo em Pilão Arcado foi outro momento marcante da cidade. A trilha sonora desse filme real pode ser embalada pelas letras de poder e tradições no sertão. O município de Pilão Arcado, localizado no coração do semiárido baiano, carrega uma história marcada por práticas de coronelismo, um sistema político que consolidou o poder local nas mãos de poucos durante o período republicano brasileiro. Com suas raízes firmemente plantadas na economia rural e nas relações de dependência, o coronelismo em Pilão Arcado revela como as elites locais controlavam não apenas os recursos econômicos, mas também os aspectos sociais e culturais da comunidade

Em seu contexto histórico e político, Pilão Arcado sempre traz desafios impostos pelo clima e pela geografia. No entanto, essas mesmas condições realizaram um ambiente fértil para a centralização do poder ancoradas em figuras de liderança locais conhecidas como coronéis. Essas lideranças não eram apenas proprietárias de vastas terras, mas também mediadoras políticas e sociais, desempenhando papéis essenciais em um ambiente carente de estrutura estatal

O coronelismo em Pilão Arcado seguia o modelo típico do sistema encontrado em todo Nordeste brasileiro. A posse de terras férteis ou estratégicas próximas a rios como o São Francisco conferia aos coronéis o domínio sobre a economia local. Ali eles decidiam quem poderia plantar, colher ou viver em suas propriedades. O controle político foi consolidado por meio de práticas como o voto de cabresto, em que os trabalhadores rurais votavam sob coerção ou influência direta dos coronéis da época. 

O bebê já de cabelos grisalhos já não é mais o mesmo. Em 2015 publicamos o artigo Retrocessos que não impediram nossos avanços políticos e sociais. Nele, refuta-se a ideia de um município que só conheceu um lado da sua história, que foi a coronelista para aventar-se sobre seus avanços democráticos. A Lei da Mordaça esculpida no artigo, colore um outro momento da cidade, logo, a partir dali a ponte fechando ciclos, abrindo horizontes começou a ser erguida. 

Cercado pelo cinturão formado pelas cidades de Campo Alegre de Lourdes, Remanso, Barra do Rio Grande e Xique-Xique, Pilão Arcado tem posição geográfica privilegiado que desperta investidores, antes, porém, carece-se de um projeto pensado em levar a cidade ao futuro. Uma iniciativa ambiciosa que pode abordar uma ampla variedade de áreas, desde sustentabilidade e tecnologia até infraestrutura urbana e qualidade de vida. 

Os tambores desse samba, são ainda bem surdos. No samba que se remelexe  em Pilão Arcado, falta um verso importante.  Sair da roda e pular no carnaval das alegorias técnicas e econômicas. Seu Rei “Momo” Dom Lencastre, fez a cidade nascer, agora, ela precisa crescer em outras avenidas.  

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